Ver - Anita Malfatti
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  • 1923

    Em fevereiro, Mário de Andrade escreve uma crônica de arte para a Revista do Brasil, tratando de pintoras brasileiras. Após elogiar Anita Malfatti e Tarsila do Amaral, Mário critica severamente as artistas Georgina de Albuquerque e Regina Veiga. A crônica possibilita entrever a posição contrária do escritor à pintura que valoriza a imitação da natureza, por assim dizer, consagrada pela Academia de Belas Artes do Rio de Janeiro:

  •  

    PAISAGEM [ÁRVORE], 1921-1923 c.
    óleo s/ madeira, 26 x 33,7 cm
    ex-col. Menotti del Picchia

    *Sobre esta obra de Anita Malfatti, Marta Rossetti escreve: “provavelmente presente da pintora para Menotti del Picchia durante os anos de convivência, entre 1921 e 1923” [Cf. MRB, vol. 2, p.40]
  •  

    SYLVIO WHITAKER PENTEADO, [1921-23]
    óleo s/ tela, 46 x 39 cm
    Museu de Arte Brasileira, FAAP, SP

  •  

    FERNANDA CASTRO, 1922
    óleo s/ tela, 73,5 x 54,5 cm

  •  

    MÁRIO DE ANDRADE, c. 1923
    óleo s/ tela, 44 x 38 cm
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    No ano de 1923, Oswald de Andrade já se encontrava na França, fazendo contatos e divulgando as artes brasileiras [Cf. Le Figaro, Paris, 23/05/1923]. Solicita, então, a Mário de Andrade, que lhe envie “coleções” da revista Klaxon e “números da nova fase da Revista do Brasil”. E acrescenta: “Peço mesmo que fales com Paulo Prado ou Lobato.” [Cf. Carta de 4/3/1923. Fundo MA. Arquivo IEB-USP]

     

    Possivelmente, Oswald refira os números da Revista do Brasil a partir do início de 1923, quando Paulo Prado passa a ser diretor, ao lado de Monteiro Lobato, e Mário de Andrade começa a contribuir com artigos e crônicas para a revista.

  •  

    Anita Malfatti recebe o Pensionato Artístico do Estado e, no final do mês de agosto de 1923, segue para a França.

    Em Paris também estavam vários brasileiros, como Di Cavalcanti, Victor Brecheret, Sérgio Milliet, Villa Lobos, Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral, Antônio Gomide, a escultora Adriana Janacopulos e, entre outros, a pintora Helena Pereira da Silva, filha de Oscar Pereira da Silva.

    Poucos meses antes da chegada de Anita Malfatti na capital francesas, lê-se em periódico que a Academia Internacional de Belas Artes expõe obra sua na inauguração da Maison de l´Amérique Latine em Paris.

     

    La Presse, Paris, 27/5/1923

  •  

    Em 1922 Sérgio Milliet elogiara as obras de Anita Malfatti exposta na SAM [Cf. O Estado de S. Paulo, SP, 14/2/1922], mas, ao ver a produção da recém-chegada artista em Paris entende a pintura dela como “passadista”. É o que se lê em carta que Sérgio envia a Mário de Andrade. [Cf. 16 out. de 1923. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

    Em outras cartas, a não aceitação das pesquisas de Anita pelo poeta “Serge” também se verifica. Ao escrever para Yan de Almeida Prado, em 11/10/1923, após relatar uma discussão, “incidente Villa-Oswald”, afirma: “Anita já está trabalhando infelizmente com o Mauricio Denis”. [Cf. Yan, A Grande Semana de Arte Moderna, p.68]

    Possivelmente, o futuro crítico de arte Sérgio Milliet não apreciava os trabalhos de Maurice Denis ou suas teorias, pois, ainda que Anita Malfatti tenha conhecido o referido pintor que, com George Desvallières, mantinha Ateliers d´Art  Sácre (1919-1947), não há indícios que a artista tenha estudado com ele.

    Em carta não datada, mas dessa época, Sérgio novamente escreve a Yan falando de Anita:  “[...] Depois da última carta temos mais um membro no grupo de Paris! A Anita que chegou um pouco desapontada e desiludida” e, linhas depois, acrescenta: “Anita trouxe uns quadros assim assim do Brasil.  É bom que ela progrida aqui antes de expor”. [Cf. Yan, op. cit., p.71-72]

  •  

    Em nove de novembro de 1923, Yan de Almeida Prada recebe mais  notícias de Paris em carta que Sérgio Milliet lhe envia:

    “Reuniões interessantes em casa de Tarsila, com tudo que há de bom em Paris. Cendrars, Cocteau, Goll, Léger, Lhote, Supervielle, Maurice Raynal e os brasileiros. Estamos agora admiravelmente bem introduzidos aqui. Brecheret obtendo sucesso no Salon de Outono. Vai brevemente ao Brasil executar uma encomenda de d. Olívia Penteado. Minha volta não está definitivamente fixada. A vida da colônia artística de São Paulo continua agitada. O incidente Villa-Tarsila acabou bem e na última reunião o Villa, mais moderado, portou-se bem. Entrou tudo nos eixos. Anita também está menos ‘boudeuse’”. [Cf. Yan, op. cit., p. 73]

    A amizade entre Anita Malfatti e Tarsila do Amaral estava estremecida. Os amigos pouco apreciavam seus trabalhos, não havia razão, portanto, para convivência, mesmo porque, decidida, Anita buscava uma arte que se pautasse por caminho diverso daquele que apresentara à São Paulo após seu retorno de Nova Iorque.  Não poderia frequentar regularmente Léger, Lhothe, Cendrars quem procurava realizar “composições pré-rafaelíticas italianas”, desenhar “caipira brasileiro” e educar o traço a partir de modelos vivos – como se observa nos cadernos de desenho da artista.

    As relações de Anita na capital francesa são outras, assim como suas procuras artísticas são distintas dos desejos dos “modernistas em Paris”, o que pode ser observado em seus trabalhos, em sua correspondência com Mário de Andrade e em alguns textos que escreveu:

  •  

    Na contramão dos comentários da agitada “colônia artística de São Paulo” em Paris, lê-se em manuscrito de Anita Malfatti o que ela pretendia como pesquisa:

    “Dentro de quinze dias estava a bordo e começo uma série de estudos calmos e muito mais plásticos que me permitissem de pintar toda minha vida sem a repetição dos fogos de artifícios da primeira fase inovadora.”

    Anita Malfatti. Notas Biográficas., c.1949 - Fundo AM. Arquivo, IEB-USP

    Em 10 de janeiro de [1924], Anita Malfatti envia carta a Mário de Andrade contando-lhe sobre tela que está pintando e sobre suas pesquisas:

    “Termino atualmente o retrato de Maria. Está quase como a Estudante Russa (contente?). 2 estudos do nu. Um deles estilo arcaico mas tropical e o outro moderno – da mesma modelo. Um Namoro interno caipira brasileiro – composição simples mas engraçada. Assim à moda de Matisse sem porém aproximar-me dele. Outra composição de hoje – Um baile de colonos – não sei se ficará bom ainda. Estudos de memória pictórica (composições pré-rafaelíticas italianas). Acerto algumas, falho outras. Interessa-me imenso este estudo.

    Alguns centos de croquis bons, assim assim e ruins. Estou ainda longe de estar satisfeita com meu trabalho. Vejo agora como estava mal quando saí daí.”

    Fundo MA. Arquivo, IEB-USP
  •  

    Alguns dias antes, Mário de Andrade enviara carta a Anita Malfatti afirmando que Oswald de Andrade lhe contara que ela fazia coisas boas: “Que teu último trabalho já recorda o bom tempo do Homem Amarelo, do Japonês... Bravíssimo! Lembras-te? Tu mesmo me confessaste que depois desse período nada fizeras que te satisfizesse totalmente...”

    [Cf. carta de 3/1/1924. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

    Três meses depois, o escritor publica um artigo na revista América Brasileira, RJ, 04/1924 – Crônicas de Malazarte VII. Hiperbolizando o alcance da crítica de Monteiro Lobato, Mário de Andrade dilata o tempo entre a segunda e a terceira exposições de Anita, para escrever que ela, “mulher que sofre”, se “ocultou” por “4 ou 5 anos”:

     

  •  

    Em caderno de desenho de Anita Malfatti, da época de Paris, veem-se alguns desenhos que sugerem a composição "um baile de colonos", composição referida na carta de 10/1/[1924] a Mário de Andrade.

     

    Caderno de desenho de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais. IEB-USP

  • 1924

    No final de janeiro de 1924, Anita escreve a Mário de Andrade dando “Viva”, quer pela carta com poema que dele recebeu, quer por saber que o livro Losango cáqui lhe será dedicado. E acrescenta:

     

    “Meu passo ficou leve e surdo e minha mão riscou coisas curiosas, escute, uma mulher com um carneirinho, toda nua, com uma flor na outra mão, numa paisagem muito antiga, um riacho onde se veem os peixes, ao longe um rebanho e perto dela a planta do lírio, duas nuvens no céu verde azul.”

    [Cf. 29/1. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

     

    Há vários desenhos nos cadernos da artista que ela fez para pensar a tela PURITAS, obra que corresponde à descrição destacada, entre os quais, ressalte-se:

  •  

    Caderno de desenho de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    Nessa carta de 29 de janeiro, enviada a Mário de Andrade, Victor Brecheret também escreve em tom de zombaria:

     

    “não imagina o trabalho que me dá esta jecatatu, leva todo o dia me amolando que malcriada, espero que você de uns conselhos para o bem dela imagina que me pede sempre cigarros me come todos os biscoitos do meu café. Viva nós!”

     

    Anita Malfatti hospedara-se no hotel onde estava Brecheret e Di Cavalcanti. Posteriormente, aluga ateliê próximo ao do escultor.

    Possivelmente, nessa época conhece outro brasileiro, o pintor Antônio Gomide.

    Em um dos cadernos de Anita encontram-se desenhos desses artistas, o que pode evidenciar o convívio entre eles:

  •  

    Caderno de desenho de Anita Malfatti

    À direita, desenho de Anita Malfatti, parte superior e, na parte inferior, de Victor Brecheret:

    Abaixo, desenho de Antônio Gomide:

    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

     

  •  

    Em um dos cadernos de desenho de Anita Malfatti, encontra-se um rascunho de carta que escreveu à “ma chére Claire”. Nela a artista conta do livro que lhe será dedicado, Losango cáqui, e comenta sobre o seu primeiro “flirt” da Alemanha, que teve “o mau gosto de lhe enviar sua fotografia ao lado de sua nova noiva”.

     

    Caderno de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    Em fevereiro de 1924, em outra carta a Mário de Andrade, Anita Malfatti expõe, com clareza, que sempre foi livre em seus trabalhos:

     

    “Agora coragem, apronte-se vou dar-te uma notícia “bouleversante”. Estou clássica! Como futurista morri e já fui enterrada. Não falo a rir não. Pura verdade, podes rezar o Ite in pax na minha fase futurista ou antes moderna pois nunca pertenci a uma escola definida.

    Não estou triste nem alegre. É isto. Trabalho e trabalho e saiu assim. Não posso forçar-me para agradar a ninguém. Nisto sou, fico e serei sempre livre. Aliás, todos, ou quase todos os grandes artistas daqui estão enfrentando este tremendo problema. Matisse, Derain, Picasso. Todos passam atualmente esta reação. Andava apreensiva com isto, mas estive hoje com diversos artistas que me afiançaram ser esta a fase atual em Paris. Voltamos à mãe Natureza. [...] pintura para mim não é um divertimento, é a própria Vida é a luta não é o flirt. Com certeza achas-me horrível hoje, não sei, estive tão alegre, mesmo muito alegre e agora escrevo-te uma carta de peso. Perdoa-me rio-me sozinha.”

    [Cf. 23/2. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

    Por fim, termina sua missiva dizendo que “vai comer feijoada com Celso Antônio” – escultor brasileiro que também recebera pensão do governo para estudar em Paris.

  •  

    Após a inauguração da Maison d´Amérique Latine em maio de 1923, em 1924 é organizada, pela mesma Maison e pela então recém-fundada Académie Internationale de Beux-Arts uma exposição em Paris de arte Américain-latine. A mostra reuniu artistas argentinos, chilenos, uruguaios, cubanos, mexicanos... Entre os pintores brasileiros, participam da mostra Vicente do Rego Monteiro, Toledo Piza, Victor Brecheret, Celso Antônio, Adriana Janacopulos e Anita Malfatti.

     

     

    Caderno de desenho de Anita Malfatti. Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    Em julho de 1924, Anita viaja pela Itália. Em Veneza, encontra-se com Yan de Almeida Prado na praça S. Marco. [Cf. cartão postal, 7/7/1924. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

     

    Nessa cidade, hospeda-se na casa do pintor Enrico Vio: “(não tenhas ataques)”, escreve Anita Malfatti a Mário de Andrade em carta que lhe envia de Lucca. [Cf. carta, 18/7/1924. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

    Na província italiana toscana, a artista convive com tias, primas e pessoas que a conheceram na infância.

     

    Nesse ano, eclode a Revolução de 1924, quando o presidente de São Paulo, Carlos de Campos, abandona a cidade que passa a ser controlada pelos revoltosos, comandados por Isidoro Dias Lopes . Preocupada com as notícias do Brasil, a artista comenta com o Mário de Andrade: “Imagine se eu devesse voltar! Agora depois de tanto sacrifício seria verdadeiramente uma pena!”

  •  

    VENEZA, CANAL, 1924 c.
    lápis e aquarela, 16,5 x 26,5 cm

  •  

    A JAPONESA, 1924
    óleo s/tela, 98,3 x 79,8 cm
    Coleção Gilberto Chateaubriand, MAM-RJ

  •  

    Caderno de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    Em agosto, Anita Malfatti encontra-se em Roma, de onde envia carta a Mário de Andrade, contanto que irá “à Villa d´Este considerada a mais bela da Europa pelas 100 fontes que contém”. Sobre Florença, declara:

     

    “Em Florença achei a pintura que tanto procurava. Tanto andei, tanto vi, mas posso dizer agora que vi a harmonia perfeita. Achei-a nos afrescos do Perugino (Triptico) no Cenáculo do Guirlandaio na Capela Mediceia afrescada pelo Benozzo Gozzoli e nos mosaicos das igrejas antigas maravilhas e mais maravilhas. Vivia a perder o fôlego em Florença. Todo o Beato Angélico, que cores Mário aquilo é que é cor?!! Paulo Uccello, todo o Botticelli; certamente hei de um dia copiar a Madona do Magnificat a mais maravilhosa para mim. Cimabue Giotto o grande, aí preciso calar-me, sinto de entrar no verdadeiro mistério da pintura. Não sei como pintarei quando voltar, mas sinto o espírito muito mais fino e mais apto ao equilíbrio das massas a poder compor com mais riqueza. Peça a Deus, meu amigo, que me seja concedida a graça do progresso.”
    [Cf. carta, 19/8/[de 1924]. Fundo MA. Arquivo IEB-USP]

     

    Anita pintou tela com fontes, VILLA D´ESTE, exposta no Salão do Outono de 1927, obra que, segundo Marta Rossetti, data desse ano, quando a artista novamente visita os jardins de Tivoli. Também pintou uma tela a partir da “Madonna do Magnificat”, 1481, de Sandro Boticelli.

    [Cf. carta de Florença para Mário, 21/06/1927. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

     

    Em Nápoles, encontra-se com Zina Aita, pintora e ceramista brasileira que morava na Itália, amiga de Anita ao menos desde 1922.

  •  

     

     

    Fundo MA. Arquivo, IEB-USP

    Cartão de Zina Aita e Anita Malfatti a Mário de Andrade, datado de Nápoles, 30 de agosto de 1924.

     

     

  •  

    Anita Malfatti escreve de Paris para Mário de Andrade [setembro], dizendo ter-lhe enviado, por Couto de Barros – um dos fundadores da revista Klaxon e depois do quinzenário Terra Roxa –, “uns rabiscos a cores”.
    [Cf. carta s/d. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

     

    Em outubro, Mário de Andrade escreve a Anita Malfatti esfuziante por ter recebido a aquarela LAVADEIRAS:

     

    “Acabo de tornar a olhá-lo. Queres a minha opinião sobre ele, orgulhosinha? Pois fica sabendo que me entusiasmei. Acho-o estupendo e, como desenho, é francamente a melhor coisa que tenho de ti. Aquelas duas lavadeiras estão admiravelmente bem lançadas. A calma possante e renascente daqueles volumes, braços, pernas, bundas, costas, pescoços é uma coisa forte que enche a gente. Gostei com toda a franqueza e bem me conheces já. Se eu não gostasse ou diria francamente a minha opinião, como fiz com a tua Chinesa ou há poucos dias com o último livro do Osvaldo (Serafim Pontegrande, ainda não publicado) ou, se não falasse assim francamente, daria a entender. Ora eu te digo gritado que o teu desenho é muito bom e bem teu. Isso! minha Anita. Continua assim a trabalhar, estudar, criar e fazer coisas grandes. Sabes que, além da nossa amizade que não morre e que perduraria mesmo que um de nos decaísse, eu conservo inalterável confiança em ti. Conheço e provei durante o nosso longo convívio aqui o teu talento. Tenho a certeza que ainda darás ao Brasil algumas obras iguais ou superiores talvez ao Japonês e ao Homem amarelo. Sei disso e espero com confiança e entusiasmo.”
    [Cf. carta de 22/10/(1924). Fundo AM. Arquivo, IEB-USP]
  •  

    AS LAVADEIRAS, 1924
    nanquim e aquarela, 27,8 x 37,2 cm
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

  •  

    Há outra aquarela que Anita Malfatti pintou semelhante a esta. Além dessas obras  cujas figuras são estruturadas a partir de ovais, em seus cadernos encontram-se desenhos que são feitos a partir dessas sínteses:

     

     

     

    Caderno de desenho de AM. Coleção de artes Visuais, IEB-USP

     

    Esse modo de construção, bastante utilizado por Victor Brecheret e, anos depois, por Tarsila do Amaral, também pode ser visto na COMPOSIÇÃO COM NU SENTADO de Anita Malfatti, que data do início de seus estudos na França:
  •  

    COMPOSIÇÃO COM NU SENTADO (lado), 1924 c.
    aquarela, 27,7 x 37,2 cm

  •  

    LAGO MAGGIORE, 1924-26
    óleo s/ tela, 46,2 x 54,8 cm

  •  

    Também em 1924, Anita Malfatti trabalha três “composições”, como escreve a Mário de Andrade: O PERDÃO DE MADALENA, RESSURREIÇÃO DE LÁZARO e A PESCA MARAVILHOSA. [Cf. carta, c. de 11/1924. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

    Pouco antes, Anita Malfatti envia alguns desenhos para seu amigo Sylvio Whitaker Penteado, os quais Mário de Andrade não aprecia, como se lê em carta que ele envia à artista, datada de 13 de novembro:

    “Lembras que numa crítica que escrevi uma vez sobre ti eu disse que não gostava dos teus desenhos em preto?

    Continuo a ter a mesma opinião. Isso não te diminui em nada porque és integralmente pictural. O teu meio mais forte de expressão é a cor. O engraçado é que dentro dos teus quadros o desenho é geralmente estupendo. A estudante russa por exemplo. Uma Marinha que está com o Osvaldo. E os meus quadros maravilhosos.”  [Cf. carta, 13/11/[1924]. Fundo AM. Arquivo, IEB-USP]

    A título de curiosidade, destaque-se que esta carta é a mesma na qual Mário comenta não gostar dos desenhos da Anita “sem revestimento de sombras ou cor”, como o que foi impresso na revista Klaxon.

  •  

    Em longa carta a Mário de Andrade de 17 de dezembro, Anita Malfatti diz ter pintado um Cristo no deserto, que “parece um afresco primitivo”, e expõe sua contrariedade à opinião do escritor:

     

    “Boa-tarde São-Bom-Jesus-do-passa-pito!

    Arre!... desde quando isso agora! Puxa breca naturalmente achei e acho tudo diferente. Tens plena certeza que pensamos igual em certos assuntos mas como estou com um chapeuzinho suco todo bordado a ouro não posso falar ou encarar as coisas tão negramente assim. Os desenhos que mandei ao Sílvio são do meu gosto especialmente o ‘abaixo de medíocre’ na tua doce opinião. Se não gostasse não os mandaria ao mais sincero dos meus amigos. Bissière [Roger] por exemplo achou-o bom quanto um de Picasso e disse-o claramente. Por isso mandei-o ao S. Mas não sei o que o pequeno pensou que nunca mais me escreveu.”

    [Cf. carta, 17/12/[1924]. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]
  •  

    Também nessa carta de Anita Malfatti a Mário de Andrade, ela fala de Tarsila do Amaral. Do que é possível entender desde a correspondência anterior, as duas artistas ao menos voltam a conversar. Anita ainda relata ao escritor ter ido “ao ballet novo de Léger ontem [sic] os costumes melhores do décor. Curiosíssimo. Apoteose à sensualidade parece.”

     

    Anita não é alheia às pesquisas artísticas dessa época, tampouco aliena-se das pessoas. Ela apenas se relaciona com outros artistas em Paris que não os “modernistas ”. Sérgio Milliet ao escrever para Mário de Andrade afirma que é “lamentável o que ela pinta” [Cf. carta, 20/07/1924. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]. Apesar do julgamento do poeta e o de outros que ainda desejavam uma "Anita novaiorquina", esses juízos pouco importam à artista, visto que ela pesquisa o que interessa à sua arte. É o que se evidencia quando ela afirma: “larguei de jogar com os grandes contrastes”; ou quando escreve que em Paris começou “uma série de estudos calmos e muito mais plásticos [...] sem a repetição dos fogos de artifício da primeira fase inovadora”, entre outras afirmações da artista que se constata na leitura de seus escritos e de sua correspondência com Mário de Andrade. É certo que ter obra destacada em jornais e revistas muita vez depende de contatos ou do grupo de convivência, ainda assim, mesmo distante do gosto dos “modernistas de Paris”, Anita Malfatti não passou despercebida por alguns colunistas de jornais e revistas da capital francesa, como se verifica na consulta de periódicos de época. Mas não só. Como pensionista do Estado, no Brasil seu nome também é lembrado e, Mário, quando divulga o modernismo, também escreve sobre a artista.

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    Por vezes, os jornais de São Paulo publicavam notícias sobre os artistas brasileiros que estavam estudando no exterior.  Mário de Andrade, em carta enviada à artista em 1/12/1924, afirma que conseguiu divulgar alguma notícia sobre ela no Jornal do Comércio e no Correio Paulistano. Possivelmente, a do último periódico mencionado pelo escritor é a que segue:

     

    Correio Paulistano, SP, 16/11/1924

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    De Mônaco, Anita Malfatti escreve a Mário de Andrade, contando-lhe que chegou a compreender a harmonia da cor, a partir da cor local, a qual deve ser aplicada simultaneamente, sendo esse o mesmo “sistema” para o ritmo e o desenho.

     

    “Eis-me de novo no sol. Escrevendo sobre o minúsculo porto de Mônaco; minúsculo porque está aqui aquarelado no meu block que sustenta o papel. [...] Fui a Menton antes d’ontem e irei a Nice na semana próxima. [...] Deixei Paris e seus problemas como quem despe finalmente um vestido que não presta mais. Estou limpinha, alma e corpo bem lavadinhos. Estou aqui com uma prima de mamãe  [...] A fortuna virou para mim. Veja quanta coisa boa. Na minha pintura cheguei a uma grande étape. Fiz uma descoberta enorme ‘para mim’. Sei que agora poderei sempre conseguir a unificação harmoniosa dos meus tons e a relação entre eles de modos que pareçam todos partes componentes de um só corpo. Descobri a ‘cor local’ e aplicá-la simultaneamente conforme o problema a resolver. O mesmo sistema no ritmo do desenho. Levei dias tremendo enquanto fazia a experiência e só perguntava a Deus se por ventura eu tinha recebido efetivamente a graça de compreender esta simples e grande verdade no meu trabalho. Dias depois chega-me às mãos um livro de Cézanne no qual o mestre diz ter sido mais ou menos isto o segredo de Manet e que ele durante toda sua vida nunca esqueceria de enlever mon chapeau à Manet pour cela, mas o mestre aproveitou da lição pois mais que M. ele fez o mesmo mas embelezou isto com a cor. Trabalharei agora com método e compreensão e sei que isto marca o começo de uma época.”
    [Cf. carta, 3 e 8/4/[1925], com desenho do porto de Mônaco. Coleção de Artes Visuais, IEB-USP]
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    Carta de Anita Malfatti para Mário de Andrade, com desenho da tela PORTO DE MÔNACO, 1925/26 c.
    Coleção de Artes Visuais, IEB-USP

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    Em maio de 1925, Bety, a mãe da pintora, a irmã Georgina e o primo Arthur Krug viajam para Paris, quando Anita Malfatti deixa o hotel que estava desde sua chegada e aluga um ateliê “com um quarto e dependências”, como escreve.

     

    Nessa época, chegam à capital francesa o casal Regina Gomide e John Graz, amigos artistas aguardados por Anita, como anunciou a pintora na carta com desenho do porto de Mônaco.

     

    Em setembro, ela conta a Mário de Andrade que enviara ao Salon d’Automne  a tela MULATA, pintura de 1916/17, retrabalhada, possivelmente em 1925: “enchi-lhe os volumes que ‘não estavam cheios”. [Cf. carta 27/10/[1925]. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP] A obra é exposta sob o título TROPICAL.

     
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    TROPICAL, 1916/17-1925
    Pintura reproduzida no O Jornal, RJ, 21/10/1928.
    Óleo s/tela doado à Pinacoteca do Estado de São Paulo

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    Acerca de suas pesquisas artísticas, Anita Malfatti expõe a Mário de Andrade que trabalha com meias tintas e serve-se de anjos estilizados:

     

    “Falemos em coisas mais leves, de Anitoca que tanto vos preocupa. Não se preocupe e não tenha medo por mim. O meu medo já passou com minha dúvida. Acho louvável você ter tanta fé, com tanta preocupação causada pelos elementos discordantes que rodeiam a você posso mandar dizer-te que meu trabalho vai bem, benzinho mesmo e sua amiga também vai tão bem tão bem que só deseja a você o mesmo Bem.
    Gosto de pintar anjos misturando sempre, i.e., num esforço de espiritualizar um pouco a concepção material da composição. São todos porém estilizados. Eu acho que nós todos do mundo amamos os anjos. Isto na composição, abre as portas fechadas.
    Faço agora portraits bem bonitos que você tenho a certeza de que gostaria. Faço tudo mais leve, na minha pintura de agora, há uma ausência completa do elemento dramático. Acabei com o sofrimento e com a dor. É mais calma, alegre, contente, um pouco engraçada sem ser cômica nem trágica. Estou nas meias tintas, larguei de jogar com os grandes contrastes pois só um El Greco pode permitir-se tais extremos convenientemente. Mesmo Cézanne nunca atreveu-se a tais loucuras, pois conhecia suas forças e valha a verdade, nunca caiu.”
    [Cf. carta, 4/11/[1925]. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]
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    Em outra carta enviada ao escritor, a artista comenta que seus desenhos  “só de linhas” são admirados:

     

    “[...] Continuo nos meus nus. Aliás os desenhos só de linhas são altamente apreciados. Acharam-nos com ‘qualidade’ como os de Renoir e Rodin e 2 críticos daqui disseram não haver mulher na França que desenhe nu como A C.M. Se você já caiu morto, reviva e prossigamos. Digo isto porque M. de A. teve a cachimônia de dizer: Você é a minha inquietação grande do momento. Vou muito bem, sabe? e muito contente e tenho muitos amigos pintores épatants que tomam muito interesse no que faço e dão valor seriamente e eu logo que me encontro numa atmosfera simpática, fico feliz. Só que tenho muito e muito que trabalhar para conseguir algo de realmente bom.”

    [Cf. carta, 12/[1925]. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]

     

    Observando-se os cadernos de desenho de Anita Malfatti, vê-se a dedicação da artista na procura de um desenho cada vez mais sintético, simples e com linhas precisas:

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    Caderno de desenho de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais, IEB - USP

  •  

    Caderno de desenho de Anita Malfatti
    Coleção de Artes Visuais, IEB - USP



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