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1950
Nessa época, anos de 1950, Anita Malfatti ocupa-se com a tradução de livro de Mary Baker G. Eddy, fundadora da Ciência Cristã. Possivelmente, a artista passa a comungar essa religião após chegar em Paris.
Seus seguidores defendem a ideia de que a realidade é puramente espiritual, e o mundo material é uma ilusão. Por isso, entendem a doença como um erro mental, não um distúrbio físico.
Nesse sentido, quando Mário de Andrade diz sofrer, em 1925, por ter se apaixonado por “uma dona casada e bem moderninha”, a quem deu “um nome vago Maria”, Anita Malfatti lhe escreve:
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Há dias mandei uma carta-pito. Bem o merecias, mas compreendo que andavas com o coco virado, mas estas coisas assim deste gênero, não tem nenhuma real importância, passam.
Penalizando-se pelo sofrimento do amigo, a artista diz que lhe enviará um livro, pois deseja que a vida de Mário de Andrade se harmonize para que a saúde dele se restabeleça. Anita acredita no poder de cura da Science et santé; talvez seja esse o livro de Mary Becker Eddie que a artista envia ao escritor: “pois que é o seu espírito que não anda muito bom”.
Para demonstrar essa sua crença, Anita Malfatti conta-lhe:
Ao chegar em Paris pensei erradamente que tivesse perdido todos os amigos, toda a família e a pensão dada pelo governo só me permitia de viver na máxima simplicidade. Foi a prova necessária pois que havia orgulho e um senso muito errado do que me era devido etc. e tal. Mas eu tinha raiva e mais as coisas aparentemente pioravam. No fim desejei intensamente a morte. O que veio foi um bom castigo e a Vida. Foi o livro que mando a você que me ensinou a Viver Realmente há, i. é., existe uma resposta para todos os nossos problemas. Você diz que sua fé nunca se abalou. Eu mando a você como presente de Natal o livrinho que me ensinou o Verdadeiro Amor que nunca falha e que é perfeitamente demonstrável aqui e agora para você como para todos neste mundo.
[Cf. carta, 28/12/1925. Fundo MA. Arquivo, IEB-USP]
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Em 1963, Anita Malfatti recebe carta de agradecimento por sua contribuição na tradução do livro Ciência e Saúde com a Chave das Escrituras, de Mary Baker G. Eddy, então publicado.
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Anita Malfatti realiza exposição no final desse ano de 1950, em sua casa na rua Ceará, como notifica o jornal O Estado de S. Paulo, de 13/12, que publica na divulgação uma das telas da artista:
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1951
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Apesar da ditadura de seu governo dos anos 1937-1945, Getúlio Vargas foi eleito por sufrágio em seu último mandato. Em julho de 1951, inaugurando dependências na Universidade do Brasil, afirma, em seu discurso, que o movimento revolucionário de 1930, quer no campo político quer no social, foi motivado pelas mesmas “forças coletivas” que precipitaram a Semana de Arte Moderna. Para dar crédito a esse seu raciocínio associativo-histórico, fala da canseira brasileira “do velho regime e das velhas fórmulas”, justamente o que facultou o ocorrido em 1922 e, depois, na “revolução vitoriosa de 1930”. Após tecer algumas costuras, fabulosas, conclui o presidente: “Na verdade, o movimento modernista, nas letras e nas artes brasileiras, foi um impulso revolucionário que cresceu e extravasou, como o foi o movimento político causador da revolução de 1930.”
Getúlio Vargas não cita as pessoas que com ele trabalharam entre os anos de 1930 e 1945; mas afirma que todos os intelectuais, escritores e artistas de “todos os setores da inteligência e da cultura [...] procuravam novas formas de convivência e novas expressões para os valores antigos”.
Ainda que esse discurso tenha sido feito na reitoria da referida Universidade, ele não só foi publicado em jornal e comentado por outros periódicos, como também o “vento o levou”, como um monumento, para diversos cantos: para o Congresso Nacional e, evidentemente, no ano seguinte, para o Ministério da Educação e Saúde que promoveu as comemorações do 30º Aniversário da SAM.
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1951
Nesse ano da I Bienal de São Paulo, várias foram os artigos a favor e contras essa exposição internacional, mas não só. Até a instalação da mesma, pintores e escultores expuseram suas posições artísticas, as mais variadas, discutindo o que era arte moderna.
Anita Malfatti participa dessa primeira Bienal com três pinturas já apresentadas em outras mostras, inclusive na de 1917/18: A MULHER DE CABELOS VERDES, O FAROL e A BOBA.
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Em outubro de 1951, Anita Malfatti profere a conferência “A Chegada da Arte Moderna no Brasil”, na Pinacoteca do Estado de São Paulo.
Nesse “programa de divulgação cultural” também falaram: Gomes Cardim, “sobre a arquitetura do Aleijadinho”; Georgina de Albuquerque, sobre “Lucílio de Albuquerque” e Paulo de Siqueira, “sobre Pedro Alexandrino”: assim noticia o Estado de S. Paulo, um ano depois, para anunciar a publicação dessas conferências pela Secretaria de Educação. [Cf. O Estado de S. Paulo, SP, 27/11/1952]
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1952
Várias foram os jornais e revistas que divulgaram a Semana de Arte Moderna ao longo dos anos. A maior parte dos artigos impressos foram escritos por seus integrantes ou por amigos. Do que se pode verificar em periódicos, a Semana de Arte foi de fato alçada a símbolo da modernidade no Brasil em seu trigésimo aniversário, quando o governo a oficializou e o Ministério da Educação assim a divulgou.
Projetou-se também para este ano o lançamento da “primeira história do movimento”, de Mário da Silva Brito, a qual, entretanto, não ficou pronta a tempo das comemorações desse ano de 1952.
O Diário Carioca, acompanhando o evento, já em janeiro começou a tratar da SAM, convidando “seus colaboradores, muitos dos quais vindos dos primórdios do movimento modernista” a cederem entrevistas ou escreverem artigos sobre o evento de 1922. Portanto, estão impressos em suas páginas depoimentos de intelectuais e de artistas, pontos de vista diversos sobre o evento, na coluna “Trigésimo Aniversário da Semana de Arte Moderna”.
Di Cavalcanti foi o primeiro a falar [3/2]; Manuel Bandeira, chamado São João Batista do modernismo, resiste à entrevista e depois a concede [10/2]; Anita Malfatti, em discurso semelhante ao pronunciado na Pinacoteca do Estado de São Paulo, também deu a sua contribuição com um “depoimento” publicado em 24 de fevereiro: -
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Menotti del Picchia profere sua conferência no Ministério da Educação e Saúde, iniciando-a por concordar com Getúlio Vargas. Afirma Menotti que em “sua mensagem de 1952 ao Congresso”, Getúlio afirmou “que o espírito de libertação que surgiu com a Semana de 22 preparou o caminho para a Revolução de 1930 e para a renovação da nossa cultura.”
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Anita Malfatti participa da Exposição comemorativa da Semana de 22 no Museu de Arte Moderna de São Paulo, ocasião que Segall, por desavenças, retira suas obras da mostra.
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São Paulo, na época, sequer possuía Escola de Belas Artes como a Nacional do Rio de Janeiro, e a então recém-fundada Sociedade Paulista de Belas Artes organiza essa exposição no Palácio das Indústrias, da qual, como se destacou, Anita Malfatti também participa:
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Em outubro de 1952, morre a mãe de Anita Malfatti.
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1953
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No ano seguinte, Geraldo Ferraz escreve artigo em que trata de Lasar Segall e de Anita Malfatti como os pioneiros da arte moderna. Sem os colocar em qualquer arena, Ferraz desenvolve seu texto passando por eles, pela SAM, pela exposição da Casa Modernista, pelo CAM e o SPAM, até chegar às Bienais. Enfim, constrói uma São Paulo sobre a qual, como o próprio crítico escreve, tradição “não pesa na alma”, como em outras cidades do Brasil. O crítico procura explicar a “adoção do novo espírito da arte”, que passa – sempre segundo o crítico –, pela imigração que “trouxe doutras plagas as suas tradições”.
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